quinta-feira, 2 de julho de 2009

Fio de nylon

Hoje resolvi cortar a grama. Para não forçar demais as costelas, apanhei a roçadeira elétrica muito mais leve que a outra, à gasolina.
É impossível não lembrar de você nestas horas. A companhia para manter o gramado limpo. As botas de borracha. Andar na frente procurando a sujeira dos cachorros e retirá-la com a pá para que o fio de nylon não espalhasse bosta pra todos os lados, incluindo as pernas da calça. Juntar e recolher a grama para virar adubo. Inverter as posições, você acionando a roçadeira, eu ajudando. A impossibilidade de alcançar a grama e o mato do caminho até a porteira, apesar das extensões do fio elétrico.
Não há como não lembrar de você quando o fio tritura as folhas caídas da canforeira e o cheiro se espalha lembrando linimento para dores (totalmente ineficaz nos ferimentos invisíveis).
É impossível esquecer que no trágico dia passamos, a seu pedido, na concessionária para comprar o kit de nylon para a roçadeira mais potente e com muito mais autonomia. Eu dizendo que ia comprar, mas que seria para que você usasse. Você sorrindo dizendo que ia aprender. Não há como não pensar, inutilmente, que o tempo gasto na compra poderia ter evitado o acidente.
Afastar do pensamento o propósito de deixar a grama crescer abandonada, mais ou menos como eu me sinto sem a esposa, sem a amiga, sem a companheira, sem a amante, sem a enfermeira, sem a minha melhor parte. Manter afastada essa idéia mesmo depois de ter a certeza de que, você não vai apreciar e comentar o resultado.
Tentar deixar o gramado limpo, com jeito de tratado, mais pelo trabalho que distrai e exercita, pelo calor do sol nestes dias tão frios e pelo eco de sua voz sempre que o fio de nylon acaba ou prende no cabeçote difícil de abrir:
-Troca o fio pra mim?

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