terça-feira, 27 de setembro de 2011

Amores de plástico.

Há pessoas que preferem flores de plástico. São coloridas, parecidas com as verdadeiras e não dão nenhum trabalho. Quando ficam velhas ou com as cores abatidas, são simplesmente jogadas fora. As lojas de R$ 1,99 fornecem outras.
Outras não dispensam de modo algum as verdadeiras mesmo sabedoras de que terão beleza efêmera e necessitem de esporádicas trocas de água nos vasos. Algumas outras pessoas, entretanto, não se contentam nem com umas e nem com outras. Preferem as flores vivas, aquelas que são criadas em vasos ou jardins. Sabem que estas precisam de carinho, atenção, água, de vez em quando adubo e/ou troca de terra e até mesmo combate às pragas.
Alegam estas últimas pessoas, que as vivas são incomparáveis. Seguem a rotina de todos os seres vivos, aparecem como botões, desabrocham e fenecem. Suas formas e cores são inigualáveis e mutantes à medida que se desenvolvem. Além disso, boa parte delas é perfumada. Do escandaloso perfume das gardênias à humilde fragrância das rosas.
Cada uma destas flores não se mostra o tempo todo. Há o tempo em que se recolhem nas suas hastes, folhas e raízes, acumulando forças para florescer novamente. Nem por isso se pode descuidar das plantas. É necessário dar-lhes a devida manutenção. É imprescindível a atenção e o carinho. As regas, a troca de vasos e a retirada de folhas e ramos mortos. Tarefa diuturna. Bem cuidadas, a recompensa não tarda. E como é fantástica a recompensa!
Acontece coisa semelhante com amizades e amores. Com relacionamentos. Todos precisam de constante manutenção. Há de haver compartilhamento. Duplos cuidados. Não há relacionamentos de mão única. Se uma das partes se interessa, se preocupa, cuida e acarinha, mas não há a necessária contrapartida a relação definha, seca, fenece. É necessário conhecer-se a planta. Saber se precisa de mais ou menos água, mais ou menos sol, se suporta podas ou não. Que quantidade e que tipo de nutrientes são imprescindíveis para que prospere plenamente.
Há, ainda assim, quem acredite em relações de R$ 1,99. Há quem acredite que relacionamentos sobrevivam sem dupla doação. Há quem se dedique às relações eletrônicas, às mensagens prontas copiadas e enviadas ao mesmo tempo para os duzentos ou quinhentos amigos (??), em lugar de um oi, olá ou como vai, ditos ou escritos individual e pessoalmente. Há quem prefira ter e cultivar quatro amigos (como o Chicão de Itanhaém que os identificou entre os conhecidos quando ficou doente e necessitado) e quem queira ter um milhão de amigos, como se fosse possível tê-los nessa quantidade (como cantava o Roberto Carlos antes até que a internet se espalhasse globalmente). Talvez seja o caso de redefinir-se o significado das palavras amor, amizade, afeição, dedicação e benevolência.
Nestes tempos de amores virtuais ou eletrônicos, talvez seja o caso de substituir-se tudo isso por curtir (que alguns dicionários ainda registram somente como preparar o couro, endurecer, sofrer, padecer e suportar). João curtiu Maria. Maria curtiu José. João descurtiu José e Maria.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Cancelamento da I Olimpíada de Esportes Aquáticos de Musácea.




Agora que já iam avançadas as inscrições para os Jogos Olímpicos de Musácea, os lagos, piscinas e raias olímpicas que seriam utilizados nas competições foram cobertos por grossa camada de asfalto. Pelas informações recebidas na redação, a municipalidade achou muito elevados os custos para a instalação das balsas que transportariam veículos e passageiros de um lado ao outro das enormes massas de água existentes na estrada (onde ocorreriam as disputas), e após estudos acurados, decidiu assoreá-los completamente. Como se pode observar nas fotos, as raias que estavam quase cheias, foram totalmente cobertas. Aos inúmeros funcionários que estavam sendo contratados pela administração do evento e às diversas confederações sul-americanas que já tinham mandado suas inscrições, encarecidamente pedimos desculpas.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Rodeio, UFC e a nossa hipocrisia - Parte 2. Prá Thais.

Das generosas pessoas que lêem estas mal traçadas linhas, uma, que adoro, postou um comentário, na postagem anterior, que tomo a liberdade de transcrever:
“Contrariando um pouco você vou dizer que odeio rodeios, mas gosto muito de UFC. Para mim, a diferença é clara: Os lutadores estão lá por livre vontade, enquanto os animais, vítimas de abusos incontáveis, se tivessem opção, certamente estariam bem longe, usando suas tão queridas "bolas", picanhas e lombinhos de forma mais agradável a eles... rs
Já disse que te amo?”
É ótimo ser contrariado um pouco, principalmente por quem se ama. Isso dá margem para me estender sobre o assunto.
Achar que os lutadores estão lá por livre vontade não seria forçar um pouco a barra? Não estariam eles lá, também como animais, sangrando e fazendo sangrar porque a grana que lhes é oferecida, pelas empresas que os exploram, é muito melhor que a recebida como pedreiros, lavradores, estivadores, etc., etc.? Não lhe parece ser o mesmo caso dos peões? Que outras chances de fama e riqueza teriam eles, sem estudo e sem outras oportunidades, senão servirem à sanha daqueles que pagam para assistir a essas e outras carnificinas que expõe o lado mais violento e detestável dos seres ditos humanos?
Não serão os galos de briga, os bois e os cavalos dos rodeios muito melhor tratados e cuidados do que se estivessem nos quintais e pastos à espera de virarem coxinhas, picanhas e salsichas? Os animais, tanto esses quanto os do UFC, não parecem mais saudáveis? Não brigam aqueles bichos por território, galinhas, vacas e éguas ou para proteger os filhotes? Não brigam os humanos, e se matam, por mulheres, dinheiro, petróleo, carros, bolsas e celulares? Que mal teria então ganhar uma puta grana com isso lotando estádios, ginásios e cadeiras diante dos televisores?
O mal, prá mim, é ganhar uma puta grana com isso. Fazer disso o deleite de quem possa pagar. É incentivar outros a fazerem o mesmo, nas arenas, nas ruas, nas casas, nas escolas, no dia a dia. É provar, incentivar e incutir, principalmente aos mais novos, que com violência também se pode ficar muito rico e famoso. Não lhe parece hipócrita mostrar UFC nos televisores e, logo em seguida, dizer que as agressões nos lares e nas escolas são erradas?
Não seria o caso de construirmos, nas casas, nas escolas e nas praças os tais octógonos? Cada criança só poderia espancar seu coleguinha e fazê-lo sangrar dentro de tais espaços. As outras crianças pagariam para ver. Não valeriam chutes nos pintinhos e nas pererequinhas. Os vencedores passariam de ano e os perdedores teriam que estudar. O presidente dos Estados Unidos levaria para a arena, que se construiria na ONU, o seu colega do Iraque. Se vencesse poderia explorar o petróleo do outro país e, principalmente, as mulheres e crianças iraquianas não seriam assassinadas pelos soldados americanos. Os ladrões esperariam pelas suas vítimas junto aos ringues. Se ganhassem poderiam levar seus anéis, bolsas e celulares. Além dos chutes no saco não se permitiriam armas. Se a vítima vencesse voltaria para sua casa apenas sangrando e com algumas fraturas, mas com seus pertences. O ladrão esperaria outra vítima mais fraca, mas ainda assim dentro dos limites de sua categoria. Quem não quisesse ser assaltado, simplesmente evitaria as praças com octógonos.
Não lhe parece hipócrita dizer às crianças na mesa de jantar que apertar o pinto dos bois e cavalos, para que pulem, é condenável, mas que precisam comer carne para que fiquem grandes, fortes e saudáveis? Não deveríamos também dizer-lhes que o franguinho teve o pescoço quebrado para que morresse. Que o porquinho levou uma facada no coração e o boizinho morreu com uma marretada na cabeça? Que foram castrados para que ficassem mais calmos e gordos?
Não há certa similitude no “fabuloso” capitalismo selvagem em que vivemos? Alguns imperadores determinam que a maioria seja castrada nos estudos, nas condições de trabalho e vida e nas remunerações, para que fiquem mais calmos e mais abunde a mão de obra barata? Não nos jogam a todos nas arenas e nos octógonos para que disputemos com lágrimas, tapas, pontapés, sangue e fraturas as migalhas que nos jogam. É um pouco pior porque valem o dedo nos olhos e os chutes no saco.
É muito pior porque a cavalgada dura bem mais que os oito segundos e não pulamos e nem tentamos derrubar os cavaleiros.
Voltando à sua mensagem, você vive me contrariando. Eu queria ver você muito mais vezes, você não vem. Eu queria abraçar você todos os dias, você não quer. Eu precisaria do seu sorriso e do seu carinho sempre e você não permite. Dessas contrariedades, definitivamente eu não gosto, se bem que agora fica mais claro: Que coração pode ter uma sobrinha que gosta de UFC?
E, sim, você já disse. Mas foram tão poucas as vezes que eu acabo esquecendo se não sou permanentemente lembrado (deve ser coisa da idade). A recíproca é absurdamente verdadeira.